A malária, mundialmente um dos mais sérios problemas de saúde pública, é uma doença infecciosa causada por protozoários do gênero Plasmodium e transmitida ao homem por fêmeas de mosquitos do gênero Anopheles, causa febre, e outros sintomas. Quatro espécies de plasmódio podem causar a doença: P. falciparum, P. vivax, P. malariae e P. ovale (essa, de transmissão natural apenas na África), muitas vezes é fatal.
Em um estudo publicado na última edição da revista Cell Host & Microbe, Miguel Soares e sua equipe no Instituto Gulbenkian de Ciência (IGC), em Portugal, descobriram que o desenvolvimento de formas graves de malária pode ser prevenida através de um mecanismo simples que controla a acumulação de ferro nos tecidos do hospedeiro infectado. Eles verificaram que a expressão de um gene que neutraliza ferro no interior das células, denominados H Ferritin, reduz o stress oxidativo prevenindo danos nos tecidos e a morte do hospedeiro infectado. Este mecanismo de proteção oferece uma nova estratégia terapêutica contra a malária.
Indivíduos infectados ativam vários processos de defesa que buscam eliminar o parasita. Mas, isto não é totalmente eficiente em termos de evitar as formas graves da doença, Miguel Soares e colaboradores em estudo publicado agora na revista Cell Host & Microbe demonstram que essa estratégia de defesa age através da regulação do metabolismo do ferro no hospedeiro infectado.
Sabia-se que a restrição à disponibilidade de ferro para os parasitas pode reduzir a sua virulência, ou seja, a sua capacidade de causar doença. No entanto, esta estratégia de defesa tem um preço, vai acumulando ferro tóxico nos tecidos e órgãos do hospedeiro infectado, o que pode levar a danos no tecido, aumentando, em vez de prevenir a gravidade da doença. No trabalho experimental conduzido agora Raffaella Gozzelino, pesquisador sênior no laboratório de Miguel Soares, demonstra que o hospedeiro infectado supera esse problema por induzir a expressão de H-ferritina, que desintoxica ferro. O efeito protector da H-ferritina previne o desenvolvimento de formas graves e muitas vezes letal de malária em camundongos.
Também participaram dos trabalhos Bruno Bezerril Andrade (National Institute of Allergy and Infectious Diseases, National Institutes of Health, USA), Nivea Luz e Manoel Barral-Netto (na Fundação Oswaldo Cruz e Faculdade de Medicina, Universidade Federal da Bahia, Brasil), analisaram amostras de indivíduos infetados com Plasmodium em Rondônia, Brasil. Os resultados obtidos mostram que, entre os indivíduos infetados, os que tinham os níveis mais altos de Ferritina apresentavam formas menos severas da doença. Estas observações, em conjunto com os resultados obtidos nos ensaios com ratinhos, mostram que a Ferritina confere proteção à malária sem interferir diretamente com o parasita que causa a doença, ou seja, a Ferritina confere tolerância à malária.